"Aquilo
que está escrito no coração não necessita de agendas porque a
gente não esquece. O que a memória ama fica eterno."
Rubem
Alves
As
mãos acolhem o livro. Selecionam a história. Recebem os ouvintes,
um grupo de Servidores Públicos Municipais que estão se preparando
para a aposentadoria.
Minhas mãos distribuem ao centro do
grupo sementes de Girassóis. Neste momento, tenho mãos de
jardineira. Estou ali para "florestar corações"... E é
assim que me apresento.
Carol Spieker, minha companheira no projeto
"Rios da Alegria" tem as mãos inquietas. São instrumentos
no ofício que tão bem representa. Mostra, gesticula, aponta...
Encanta! Sua mão exibe seu compromisso com o Arte. Amor
incondicional. As mãos que contam histórias movimentam Carol de um
cenário imaginário a outro. A plateia vai com ela.
Minhas mãos
demonstram meu entusiasmo. Quentes e úmidas pela emoção,
complementam minhas ideias. Falo de uma FLOR AMARELA,
teimosa...persistente. Falo ainda do homem que a encontra, vê na
florzinha indefesa um obstáculo no seu caminho, que precisa ser
enfrentado a qualquer custo. Esperança. Entusiasmo. A identificação
de quem ouve pode ser observada também pelas mãos que descansam
agora sob o colo, soltas... ou unidas. Seria uma prece inconsciente
em defesa da flor?
Minha próxima história fala de uma Pipa. Relato
colhido no quintal de uma Escola da Terra. Conheci as mãos do
pequeno Ivan, protagonista da minha história, que "deram vida"
ao brinquedo de papel de seda colorido...objeto animado do relato. E
também a Escola. Palco dos voos mais altos que já pude sonhar... Um
céu, onde podíamos fazer voar a alegria, a liberdade e a fantasia.
Minhas mãos voam na lembrança de uma pipa no céu. Neste momento,
as mãos de quem me ouve deslizam pelo rosto. As pipas de cada um,
soltas ao longo da vida, são lembradas. Desapego. Mãos tentam
conter uma lágrima teimosa, escorrendo emoção.
Neste
momento, Seu Jairo aponta sua mão para os colegas chamando a minha atenção. "Olha
ao teu redor!"- Pediu ele. Seu Jairo fora morador de rua, em boa
parte da vida. Hoje, pedreiro, aguarda também a aposentadoria. No
chão, parte de nossos ouvintes, confortavelmente seguram o
queixo com as mãos... Visivelmente mergulhados nos relatos
apresentados.
Seu Jairo lembra que era assim que ele, primos e
irmãos ouviam as histórias da avó, ao redor de um fogão a lenha.
Histórias movidas pelas mãos dos pequenos ouvintes. Que
alternadamente acariciavam a cabeça da contadora de história, num
gostoso cafuné. Este era o combinado...os meninos só poderiam ouvir
o final da história, se as pequenas mãos também prosseguissem no
carinho.
Foi possível sentir aquelas mãos grossas de pedreiro,
procurando na minha cabeça alguma outra história. Foi possível
tocar o mundo com as mãos do outro. A
enxergar a história do outro, mesmo que seja triste. Éramos a
própria história contada, e pudemos tocar o outro que também se
contou (e se encontrou) ali na mesma narrativa, pudemos ser então,
ao mesmo tempo, nós e o outro. E assim, neste espaço comum,
com nossas emoções compartilhadas e nossa capacidade de buscar
finais felizes, talvez pudemos tornar a nossa história – e a do
outro - menos triste.
Vistas por este prisma, narrativas podem
mesmo iluminar quem está na escuridão? Podem ensinar algo a quem
não quer nem saber? Aprendi, com Rubem Alves, que as palavras podem,
sim, ser capazes de alegrar e trazer a primavera até para as areias
e gelo...
E quando isso acontece...
E quando isso acontece...
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